sábado, 1 de outubro de 2011

sonhos&devaneios numa terça de manhã. [parte 1]


tempo seco em brasília, oito da manhã. eu saía da 410 em direção à 407. sul, claro. estava sem propósito, ainda que não tivesse tempo para jogar fora: começo no trabalho às 9h em ponto. naquela ocasião, eu pensava em coisas da vida, sem expectativas. apesar da terça-feira quente, decidi tomar um expresso antes do trabalho. ao virar a esquina, digo, a entrada da quadra, me lembrei da grão mestre. bom lugar para um café, uma lida no jornal, um pão na chapa e um pouco de sol. ao chegar lá, logo encontrei mesa. pela hora, não havia concorrência para as cadeiras.

sentado, folheio a interessante autobiografia do keith richards [life], enquanto espero pela simpatia das moças que servem. no local, apenas as presenças “padarísticas” habitualmente imperceptíveis. olho para a mesa ao lado.. quase me queimei! putaquepariu, eu tomei LSD ontem? não, eu sei que não. mas.. peraí! era ela mesma: sofia copolla, em carne e osso! virgins suicides, marie antoinette e.. o cerebral lost in translation. tomando café com pão de queijo, enquanto escrevinhava alguma coisa num moleskine bem usadinho. na grão mestre. em brasília. logo ali.

a moça tinha um cabelo meio desgrenhado e fundo de garrafa pretinho, camisa branca de manga curta [com botões], calça risca de giz. não estava de all star mas exibia um sapatinho vermelho de boneca, típico de 1996. esmalte vermelho nas mãos, ela era muito branca, meio baixinha e muito, mas muito mais charmosa do que eu pensava. como sói acontecer, a beleza não era proporcional ao charme. o tempo passava, e ela continuava escrevendo naquele caderninho. concentrada, fazia umas coisas esquisitas com a boca: mordiscava o lábio inferior. enquanto acabava o segundo café, não agüentei:
- excuse me, can i borrow the chair? foda, mas a timidez há muito deixou de ser minha amiga. não perderia a chance de ver os dentes da jovem.
- pode falar português, eu entendo - putz.. viagem pra ser viagem, tem de ser.. viagem! ela falava português.
pra jogar conversinha fora, comentei que adorava lost in translation. ela sorriu como quem encontra a brasserie rosario aberta em dia quente, e agradeceu. eu já não entendia nada, mas entrei na viagem: pedi um instante e avisei no trabalho que havia tido uma emergência: não voltaria naquele dia. recuperado do susto, perguntei logo o que bill murray susurra para scarlett johanson ao final do filme. ela sorriu e mandou:
- você acha o filme charmoso?
- pra caralho.
- gosta daquela sequência do susurro?
- acho poesia em um filme perfeito, econômico.
- pois bem. se eu te disser, todo o charme se perde.
não é que a esquisita tem razão? claro! adorei ser enrolado por sofia. e aproveitei o ensejo:
- você tem tempo, minha jovem?
- tenho. estou acabando umas anotações mas fico em Brasília até amanhã.
- quer tomar café num lugar legal, intimista, mais charmoso? – mandei, sem papas. ela sorriu um sorriso engraçadinho.. [porra, eu tava no céu!]
- você conhece Brasília? – ela indagou em tom “metralhativo”.
- sim. nasci aqui. não tenho gigantesca simpatia pela cidade, mas se pode curtir bastante algumas coisas. como o CCBB, por exemplo. é um complexo artístico e cultural, mantido pelo maior banco estatal brasileiro. ela gostou. paguei a conta e fomos – no meu accent 1996 conferir a programação de mostras.

a tarde foi deliciosa: ouvimos choro [estrangeiros devem conferir o estilo, tão brasileiro quanto o samba], comemos no café do local e conversamos bastante. ainda veríamos a exposição sobre um modernista esquisito daqueles. mostrei-lhe a UnB e depois alguns pontos turísticos, como o palácio do itamaraty. e o café? apostei na boa certeza: Ernesto, na 115 sul. parece um mini-enclave de palermo soho. lugar transado, cafés criativos e bem tirados e simpatia avassaladora de Juliana, a proprietária. vale a dica. enquanto dávamos conta de alguns caffé lattes e uns bolinhos de sabor convidativo, conversamos muito. o fim da tarde gostosa foi decretado por Sofia:
- acho que para um devaneio, está de bom tamanho..
- hã?! – devolvi. como assim? agora que estava ficando delicioso?!
- é assim, porque boas viagens são assim: curtidas, vividas, verdadeiras [não necessariamente reais..], e aproveitadas. putz, beleza.
- mas e agora? posso ao menos ter seu telefone? [eu simplesmente tinha de perguntar!]
sofia, não-linda, não-gostosa, mas maravilhosamente charmosa, sorri com metade da boca [como a chata da katie holmes fazia], mexe no cabelo, se aproxima e, tocando meu rosto, sussurra meia frase arrebatadora..
ah, sacana!! como escutar aquilo e não se apaixonar?

tudo bem, como diz maria luíza: “é tempo de retornar”..