quinta-feira, 2 de julho de 2009

doc e as baratas

aquele koreano esquisito, dono de um moquifinho no upper westside, só não gesticulava mais do que o bermardinho do vôlei, para tentar me convencer a comprar aquele par de doc marten’s: não precisava. em minha primeira viagem internacional, há exatos dez anos, se havia um bem material que adquiriria com certeza, era minha vintage 460 8-hole doc marten’s boots. era sonho de consumo há tempos, ainda não adquirido, menos pelo preço absurdo [cotada em libras], e mais pela dificuldade de encontrar no Brasil. lembro-me de uma vez ter visto uma loljinha em Belo Horizonte, com um único par: roxo. claro, BH tem tradição em butecos, não em botas. outra vez, na saudosa WOM, em Bsb, um “jovem abastado” [provavelmente, um dos garotos do low dream] encomendou uma, que não lhe serviu e o rapaz deixou à venda na loja; essa era preta, eba! mas dois números acima do meu. Foda: homem deve ter pé de homem. mas voltemos à NY.

eu entrara na lojinha, pois havia passado na porta e a vitrine estampava um belo exemplar, novinho, preto e que partecia meu número – falando não-metaforicamente. entrei, olhei, fiquei interessado e pedi para experimentar. o koreano era muito engraçado, parecia o cara do falling down, aquele em que michael douglas enlouquece e sai matando todo mundo [ah, ele podia ter entrado numa central de telemarketing] .. well. como eu havia mostrado interesse total – e muito conhecimento sobre o produto, eu e o koreano conversamos uns 15 minutos, uma eternidade para a cultura pasteurizada do “next in line, sir”! ele tinha uns 40 anos e havia morado em Londres: o cara foi punk! e não parecia de butique, mas punk mesmo, tipo podreira, que dormia em squads, cospia no sapato de executivos limpinhos, arrotava sem cerimônia em qualquer lugar. claro que 20 anos mais velho, a conversa foi permeada por dicas para assentos [detalhe: assentos] na brixton academy, ou os contatos de um cara que conseguia ingressos dos lakers, na pista, por 200 dólares.

bom, papinho vai, conversa vem e o cara continuava argumentando em favor da marca da “costura amarela”. Falou da biqueira de aço, o famoso “steel-toe”. boa, mas eu queria um modelo um pouco menos útil para chutar a galera num show do misfits: sem biqueira de aço. falou da qualidade do cadarço. boa, mas eu queria um pisante que também pudesse usar no trabalho.

após um tempo de discussão, acho que o cara começou a perder a peciência e disse, em inglês ríspido e quase ininteligível:
“you know man, when the nuclear breakdown take place the only two things that is gonna survive: the cucroaches and the doc marten’s boots”! ah garoto! – pensei - apelou para the day after, que havia assistido quinze anos antes. segundo o chang, apenas as baratas [tese lembrada de forma lúgubre pelo filme citado] e as botas doc martens não sucumbiriam, nem mesmo no caso de uma hecatombe nuclear. beleza, o cara é mesmo louco, mas o argumento foi criativo. comprei meu par, que por acaso tem aspecto de novo, mesmo após uma década, e está guardado em Brasília. felizmente, não cheguei a testá-las no caso de guerra atômica..